Obra fundamental de São Bento é a Regra que, constando de uma introdução ou prólogo e de 73 capítulos, resume o itinerário espiritual de conversão a Deus por meio da obediência, tendo Cristo como guia cujo amor deve estar acima de toda coisa. Confira adiante este belo texto.
Prólogo da Regra de São Bento
Escuta, filho, os preceitos do Mestre, e inclina o ouvido do teu coração; recebe de boa vontade e executa eficazmente o conselho de um bom pai, para que voltes, pelo labor da obediência, àquele de quem te afastaste pela desídia da desobediência. A ti, pois, se dirige agora a minha palavra, quem quer que sejas que, renunciando às próprias vontades, empunhas as gloriosas e poderosíssimas armas da obediência para militar sob o Cristo Senhor, verdadeiro Rei.
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Levantemo-nos então finalmente, pois a Escritura nos desperta dizendo: "Já é hora de nos levantarmos do sono". E, com os olhos abertos para a luz deífica, ouçamos, ouvidos atentos, o que nos adverte a voz divina que clama todos os dias: "Hoje, se ouvirdes a sua voz, não permitais que se endureçam vossos corações", e de novo: "Quem tem ouvidos para ouvir, ouça o que o Espírito diz às igrejas". E que diz? – "Vinde, meus filhos, ouvi-me, eu vos ensinarei o temor do Senhor. Correi enquanto tiverdes a luz da vida, para que as trevas da morte não vos envolvam".
E procurando o Senhor o seu operário na multidão do povo, ao qual clama estas coisas, diz ainda: "Qual é o homem que quer a vida e deseja ver dias felizes?" Se, ouvindo, responderes: "Eu", dir-te-á Deus: "Se queres possuir a verdadeira e perpétua vida, guarda a tua língua de dizer o mal e que teus lábios não profiram a falsidade, afasta-te do mal e faze o bem, procura a paz e segue-a". E quando tiveres feito isso, estarão meus olhos sobre ti e meus ouvidos junto às tuas preces, e antes que me invoques dir-te-ei: "Eis-me aqui". Que há de mais doce para nós, caríssimos irmãos, do que esta voz do Senhor a convidar-nos? Eis que pela sua piedade nos mostra o Senhor o caminho da vida.
Cingidos, pois, os rins com a fé e a observância das boas ações, guiados pelo Evangelho, trilhemos os seus caminhos para que mereçamos ver aquele que nos chamou para o seu reino. Se queremos habitar na tenda real do acampamento desse reino, é preciso correr pelo caminho das boas obras, de outra forma nunca se há de chegar lá. Mas, com o profeta, interroguemos o Senhor, dizendo-lhe: "Senhor, quem habitará na vossa tenda e descansará na vossa montanha santa?". Depois dessa pergunta, irmãos, ouçamos o Senhor que responde e nos mostra o caminho dessa mesma tenda, dizendo: "É aquele que caminha sem mancha e realiza a justiça; aquele que fala a verdade no seu coração, que não traz o dolo em sua língua, que não faz o mal ao próximo e não dá acolhida à injúria contra o seu próximo". É aquele que quando o maligno diabo tenta persuadi-lo de alguma coisa, repelindo-o das vistas do seu coração, a ele e suas sugestões, redu-lo a nada, agarra os seus pensamentos ainda ao nascer e quebra-os de encontro ao Cristo. São aqueles que, temendo o Senhor, não se tornam orgulhosos por causa de sua boa observância, mas, julgando que mesmo as coisas boas que têm em si não as puderam por si, mas foram feitas pelo Senhor, glorificam Aquele que neles opera, dizendo com o profeta: "Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao vosso nome dai Glória". Como, aliás, o Apóstolo Paulo não atribuía a si próprio coisa alguma de sua pregação, quando dizia: "Pela graça de Deus sou o que sou" e ainda: "Quem se glorifica, que se glorifique no Senhor".
Como, pois, irmãos, interrogássemos o Senhor a respeito de quem mora em sua tenda, ouvimos em resposta, qual a condição para lá habitar: a nós compete cumprir com a obrigação do morador!
Portanto, é preciso preparar nossos corações e nossos corpos para militar na santa obediência dos preceitos; e em tudo aquilo que nossa natureza tiver menores possibilidades, roguemos ao Senhor que ordene a sua graça que nos preste auxílio. E, se, fugindo das penas do inferno, queremos chegar à vida eterna, enquanto é tempo, e ainda estamos neste corpo e é possível realizar todas essas coisas no decorrer desta vida de luz, cumpre correr e agir, agora, de forma que nos aproveite para sempre.
Fonte do prólogo da Regra de São Bento: The Order of Saint Benedict
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